As razões para o péssimo estado de
conservação de nossas vias urbanas e rodovias são diversas. Erros de projeto
(ou simplesmente a falta deles) em função do desconhecimento técnico dos órgãos
públicos responsáveis, falhas primárias de execução por desleixo e falta de know-how das empresas responsáveis pelas
obras, a não existência de planejamento de manutenção preventiva e o total
descaso do poder público. Nada que seja difícil de ser resolvido caso haja
vontade política de fazê-lo bem feito.
Separei 10 notícias veiculadas pela
imprensa sobre problemas com obras de pavimentação em diversos Estados do
Brasil. Faço um comentário breve sobre cada problema abaixo de cada notícia
divulgada:
1.
Estradas Gaúchas Agonizam:
No Rio Grande do Sul a situação é
crítica. Especialmente após o governo do Estado, comandado por Tarso Genro
(PT), resolveu adotar uma medida totalmente descabida nos tempos atuais:
reestatizaram rodovias. Sabe-se há muito tempo que o Estado burocrático e cheio
de amarras é completamente incapaz de manter a infraestrutura em condições
razoáveis.
Diversas rodovias cujos contratos de
concessão foram encerrados passaram a ser de responsabilidade de um novo órgão
estadual criado – Empresa Gaúcha de Rodovias, a EGR. O argumento político era
de que o valor do pedágio ficaria mais barato e que o povo estaria livre de
“empresários sanguessugas”. O pedágio realmente baixou, com uma “extraordinária”
redução de R$ 2,00. O problema é que o estado de conservação das rodovias
despencou de qualidade (já não era dos melhores) e serviços básicos como
ambulância e guincho deixaram de estar disponíveis.
Não demorou muito para a imprensa
local divulgar fotos do declínio do grau de conservação. Houve polêmica sobre uma reportagem do jornal Zero Hora que mostrou
funcionários da EGR tapando buracos com o pé. Realmente, uma técnica inovadora
e de qualidade para uma boa conservação da rodovia. Segue a matéria: http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/geral/transito/noticia/2013/10/com-asfalto-e-ajuda-dos-pes-funcionarios-tapam-buracos-em-rodovia-de-encantado-4293993.html
Nota-se que no local onde o ponto de
ônibus se encontra não foi realizado nenhum reforçou ou preparo específico na
estrutura do pavimento. Um problema bastante comum em todo o Brasil.
Locais onde veículos pesados tais
como ônibus e caminhões circulam necessitam de reforços específicos em funções
das altas cargas dinâmicas oriundas do peso elevado e as forças geradas na
frenagem e aceleração. O ideal é que corredores de ônibus sejam executados em
concreto ou que o pavimento asfáltico seja bem reforçado em sua estrutura que
envolve o reforço do sub-leito (solo local), as camadas intermediárias de base
e sub-base e a própria camada asfáltica final.
3.
Operação tapa-buracos mal executada
em Nova Friburgo-RJ
Operações tapa-buracos nas cidades
brasileiras são executadas de maneira totalmente errada. Esta reportagem mostra
uma prática comum de apenas atirar o material asfáltico no buraco.
O próprio ato de tapar buraco sem
nenhuma correção das patologias já é um erro. As trincas e fissuras existentes
ao redor do buraco continuam na pista. Com a carga do tráfego passando por cima
é questão de tempo para que a parte da camada com permanência das patologias se
desagregue.
O ideal seria fresar (remover) a área
em que o buraco esteja e pavimentar de forma localizada. A panela tem que ser recortada com a
fresadora de asfalto, é preciso aplicar pintura de ligação para dar aderência
com o asfalto novo a ser colocado e compactado da maneira adequada. Este novo
material tem de estar no mesmo nível do pavimento existente. O que não ocorre
na grande maioria dos tapa-buracos executados.
Soluções paliativas tais como asfalto
ensacado a frio serve apenas em situações extremamente emergenciais. Recentemente
em eventos técnicos e feiras pelo Brasil apareceram novas empresas que vendem
“gato por lebre” ao oferecer tais soluções como uma grande inovação tecnológica
com redução de custos e melhoria da qualidade. Não há qualquer comprovação da
eficácia, mas sim elementos técnicos que contradizem os argumentos. Tem
fabricante que anuncia em seu site que “sua aplicação é simples e resolve todos
os problemas de buraco”. O buraco é uma evolução de trincas e fissuras que
sofreram carga do tráfego. Ao redor de um buraco há a presença destas fissuras
e trincas. Então como que o produto irá resolver todos os problemas do buraco?
Já outro fabricante mostra em seu site a aplicação do material com
motoniveladora, sem qualquer nivelamento e regularidade. Pesquisando no Youtube
encontramos inúmeros vídeos de aplicações muito mal feitas. Um legítimo exemplo
do barato que sai (muito) caro.
Tapar buraco com massa fria
definitivamente não é a melhor solução técnica e econômica. É como curar um
corte profundo com band-aid em vez de
dar pontos. O resultado é um pavimento remendado, sem conforto e segurança para
os usuários da via, e com a permanência dos problemas na estrutura do
pavimento.
4.
O Brasil sem asfalto: BR-163, trecho
entre Cuiabá-MT e Santarém-PA
As precárias rodovias da região norte
do Brasil ficam intransitáveis nos períodos de chuva, que em média duram a
metade de um ano. Por falta de outras opções logísticas tais como ferrovias e
hidrovias estas regiões ficam completamente isoladas em determinados períodos,
impedindo que haja qualquer evolução no desenvolvimento econômico e social
destes locais.
Hoje existem técnicas e procedimentos
para a estabilização de solos que permitem a construção de pavimentos
asfálticos sobre materiais com baixa capacidade de suporte ou saturação por
excesso de umidade. Agentes ligantes tais como cal, cimento e espuma de asfalto
poderiam ser aplicados na estabilização destes solos saturados em um projeto de
pavimentação nestas estradas que ainda sofrem com pó no período seco e lama no
período chuvoso.
Locais com grandes índices
pluviométricos necessitam de ainda mais qualidade na construção de rodovias
pavimentadas, com nivelamento extremamente preciso para que a água escoe e não
se acumule sobre a pista.
5.
Asfalto utilizado em São José do Rio
Preto-SP não é a melhor opção, segundo especialista
http://g1.globo.com/sao-paulo/sao-jose-do-rio-preto-aracatuba/noticia/2013/10/especialista-diz-que-asfalto-usado-em-rio-preto-nao-e-melhor-opcao.html
O uso de asfalto a frio tem sido uma
prática recorrente. Trata-se de um material de qualidade e durabilidade
inferior ao CBUQ convencional, que é usinado a quente, apresentando maior
coesão e resistência ao cisalhamento. O asfalto a frio é uma mistura de
agregados e emulsão asfáltica sem qualquer processo de aquecimento. O material
não garante a adesão e impermeabilidade necessária para que haja durabilidade
do pavimento, com resistência as ações do tráfego.
A utilização de uma mistura a frio
poderia ser ideal para uma camada intermediária ou em vias de baixo tráfego.
Porém nunca como camada final de rolamento de grandes cidades ou rodovias com
tráfego pesado.
6.
Camadas de asfalto sobre o antigo
geram reclamações em Rio Claro-SP
http://www.jornalcidade.net/rioclaro/dia-a-dia/bairros/111409-Camadas-de-asfalto-sobre-o-antigo-geram-reclamacoes
Um problema muito comum e
generalizado pelo Brasil. Simplesmente não há qualquer engenharia em relação à
aplicação de uma nova camada de asfalto sobre a camada antiga e deteriorada. Além
de problemas estruturais, os desníveis existentes causam perigos aos usuários
da via.
Não apenas em ruas de cidades este
problema é usual. Mesmo em projetos de reabilitação de rodovias camadas sobre
camadas são aplicadas sem executar a remoção por fresagem do pavimento
envelhecido e danificado.
A presença deste asfalto envelhecido
por baixo do novo pavimento é como se construíssem uma rodovia sem compactação
adequada das camadas abaixo, que não conseguem mais suportar as forças advindas
do tráfego. É questão de tempo para que essa camada inicie um processo de
deterioração, com reflexões de trincas e fissuras para o novo pavimento acima,
que sofrerá um processo de degradação precoce.
7.
Corredores de ônibus ondulados em São
Paulo-SP
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2014/02/calor-e-peso-dos-onibus-deixa-asfalto-de-corredores-especiais-ondulado.html
Deformações, ondulações e trilha de
roda em corredores de ônibus se tornou um fato muito comum em todo o Brasil. Os
corredores necessitam ter um projeto especial. As cargas aplicadas sobre o
pavimento pelos coletivos são altas e é preciso ter cuidado em todas as etapas
da construção da estrutura do pavimento. Desde a compactação do subleito,
passando pela aplicação das camadas intermediárias de base até a camada
asfáltica de rolamento. Qualquer falha que tenha ocorrido nas camadas abaixo
pode interferir no asfalto final. Certamente os problemas apresentados em vias
de tráfego de ônibus e veículos pesados são originados por projetos falhos e
erros de execução.
Uma ótima alternativa é o pavimento
rígido, em concreto. Seu custo é maior, mas a durabilidade também. Pode durar
até 30 anos e apresenta maior resistência a deformações. No entanto, é preciso
também ter cuidado na execução das camadas abaixo para que não haja
afundamentos e deformações que possam afetar a camada final.
Algo que não pode ocorrer de maneira
alguma é a “solução” adotada em alguns corredores de ônibus em Porto Alegre.
Feito em concreto há décadas, o pavimento apresenta problemas decorrentes do
tempo e que precisam ser corrigidos. No entanto, a prefeitura resolveu fazer
uma salada mista e aplicou material asfáltico a frio nas imperfeições do
pavimento, transformando o corredor de ônibus em um desconfortável percurso
sacolejante com obstáculos e ondulações (foto abaixo).
8
Asfalto de má-qualidade no BRT do Rio
de Janeiro-RJ
http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2014-01-10/asfalto-de-ma-qualidade-pode-explicar-rali-urbano-no-brt.html
Idem ao anterior. A cidade é outra, a
gestão é de outro partido, mas os problemas são os mesmos. Se isto acontece nas
duas maiores cidades do Brasil, imagina então no resto do país.
9.
Moradores protestam após 12 anos sem
asfalto em Palmas-TO
Descaso com a população em relação a
ruas não-pavimentadas é bastante comum em todas as regiões brasileiras. Em uma
capital de Estado a situação é ainda mais vergonhosa.
As prefeituras em geral não conseguem
trabalhar com projetos de pavimentação de forma adequada. A elaboração de
projetos, dimensionamento de maquinário adequado e fiscalização da execução são
etapas básicas que muitas vezes são realizadas de maneira precária ou
simplesmente omitidas pelas secretarias de obras dos municípios.
10.
Estradas que ligam sedes da Copa têm
trechos em obras e com buracos
Para um país que teve sete anos para
melhorar sua infraestrutura visando a preparação para a chegada de turistas a
Copa do Mundo de 2014, a situação é no mínimo vergonhosa. Sem alternativas como
ferrovias e com aeroportos saturados, as rodovias entre as cidades sede da Copa
apresentam muitos problemas que transformam o percurso em uma verdadeira
aventura. O legado da Copa com melhorias
da infraestrutura em geral para a população ficou só na promessa. Quem sabe
teremos melhorias no dia em que o povo agir como sugere a placa da foto abaixo.
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