Primeiramente
gostaria de agradecer os contatos que recebo com frequência vindos através do
blog, por e-mail ou diretamente por mensagens de WhatsApp. O blog tem mantido
uma média superior a quatro mil acessos por mês, mesmo sem eu nunca ter feito
divulgação alguma. Apenas pela sequência de postagens desde 2012 o blog acabou
ficando bem posicionado nas buscas através de palavras-chave, e assim a
“audiência” foi crescendo. Procuro sempre responder a todos, mesmo que algumas
vezes demore vários dias.
Em função de
razões pessoais e profissionais, não consegui atualizar o blog com a frequência
que gostaria em 2019. Mas estou já com alguns novos assuntos “no forno”,
prestes a serem postados.
E a pavimentação urbana do Brasil, como melhorar?
Não é preciso
ser especialista em pavimentação para constatar que a qualidade da pavimentação
das cidades brasileiras é péssima. Seja em grandes capitais ou em cidades
pequenas do interior, é cada vez mais difícil encontrar uma avenida ou rua que esteja
em ótimo estado de conservação. Mesmo em obras executadas há pouco tempo é
comum o aparecimento de defeitos precoces. Trafegar pelas vias brasileiras tem
sido cada vez mais um teste de perícia e paciência para desviar de tantos
buracos e defeitos.
Quais são as
razões? Inúmeras. Primeiramente a cultura de baixa qualificação técnica dos trabalhadores
que executam as obras e a falta de exigências de qualidade pelos órgãos
públicos responsáveis pela fiscalização das obras. A maioria das falhas são as
mesmas, repetidas do Oiapoque ao Chuí. E quais são as falhas mais comuns? Os 10
principais problemas observados na pavimentação urbana brasileira:
1. AUSÊNCIA DE ESTUDOS, PROJETOS
TÉCNICOS E PROCEDIMENTOS EXECUTIVOS DE PAVIMENTAÇÃO
Raramente os
municípios fazem estudo de tráfego, sondagem da base (para verificar o CBR
existente) ou dimensionamento adequado das camadas por algum método (Marshall,
Superpave, etc). O que fazem é simplesmente pavimentar de qualquer maneira
sobre uma base aparentemente compactada. Os problemas ocorrem principalmente em
vias onde há tráfego mais pesado, com circulação de ônibus e caminhões.
A falta de
investigações, de estudos e a ausência de projetos adequados resultam em falhas
precoces e pavimentos destruídos em tempo cada vez mais curto. No entanto os
maiores erros se percebem durante a execução. São raras as equipes de
pavimentação de prefeituras que tenham recebido treinamentos técnicos, ou que
sigam algum manual com procedimentos que os orientem durante a execução das
obras.
Em muitas
cidades se observam técnicas bizarras, como as fotos abaixo flagradas em uma
rua de Porto Alegre. Como justificar um gasto público com uma aplicação tão sem
sentido? Irregularidade de paralelepípedo basta remover as pedras, corrigir o
solo abaixo, compactar e assentar as pedras novamente.
Em Porto Alegre adotam esta
“técnica”: correção do desnivelamento da via em paralelepípedo com aplicação de
algum tipo de mistura asfáltica.
2. DESCONHECIMENTO TÉCNICO DAS
OPÇÕES DE EQUIPAMENTOS E MATERIAIS
As prefeituras
têm imensas dificuldades técnicas em definir quais são os equipamentos que
podem auxiliar na manutenção viária. Muitas vezes por falta de conhecimento de
seu corpo técnico são licitadas máquinas inadequadas para a realidade local.
Por exemplo,
uma usina de asfalto a quente exige um alto valor financeiro para ser comprada
e também para realizar manutenções preventivas. Quando ocorre alguma manutenção
corretiva, em função de alguma falha de operação, o custo é ainda maior.
Somente cidades com boa saúde financeira conseguem manter em operação uma usina
de asfalto para produção de CBUQ. Mas não basta a usina, é preciso também
planejar como o asfalto será aplicado e o maquinário necessário. Muitas vezes o
asfalto produzido é aplicado de forma inadequada, com o uso de motoniveladoras
em vez de vibroacabadoras de asfalto, resultando em um pavimento com
imperfeições.
Usina de asfalto da
prefeitura de Porto Alegre. Em 2013 foram adquiridos dois modelos de 140
toneladas por hora de produção, porém não produzem nem 20 toneladas por dia.
Mais um exemplo de desperdício de dinheiro público.
Uma
solução para cidades de médio e pequeno porte é a aquisição de usinas de PMF
(pré-misturado a frio). Há modelos de equipamentos com menor capacidade de
produção, podendo atender perfeitamente a realidade de muitos municípios. O PMF
pode ser utilizado tanto em operações tapa-buraco quanto em pavimentação de
ruas de baixo tráfego. Em vias de maior tráfego pode ser utilizado também,
desde que tenha um projeto de mistura adequado, assim como o dimensionamento
das camadas de base. Hoje no mercado há inúmeros tipos de emulsões asfálticas
sendo comercializados, podendo produzir uma mistura a frio com qualidade
3. FALHAS BÁSICAS NOS
PROCEDIMENTOS DE EXECUÇÃOSe a falta de treinamento de mão-de-obra especializada é bastante comum em grandes construtoras, a situação nas prefeituras é muito pior. Praticamente não há treinamento algum para os funcionários responsáveis. O conhecimento é repassado de forma precária dos mais experientes para os mais novos. Só que esses conhecimentos são geralmente ultrapassados, e muitas vezes estão tecnicamente errados.
É preciso que
as prefeituras através da secretaria de obras e da maior autoridade do
município (o prefeito) busquem capacitações para os profissionais responsáveis
pelas obras de pavimentação. Justamente para evitar situações como a da foto
abaixo, onde a pintura de ligação foi aplicada de maneira precária e sem cumprir
com sua função técnica no processo de pavimentação.
A fiscalização
dos serviços das empresas ganhadoras de licitação também precisa ser melhorada.
Erros básicos são cometidos em todas as etapas da pavimentação, mas raramente
alguma medida é tomada contra a empresa executora. Muito em função da falta de
capacitação dos servidores responsáveis pela fiscalização, que simplesmente
desconhecem a forma adequada de executar uma obra de pavimentação asfáltica.
Pintura de ligação aplicada
de forma manual e precária. Desta maneira não há como garantir a coesão entre
base e a nova capa asfáltica.
4. SOBREPOSIÇÃO DE CAMADAS ASFÁLTICAS
Infelizmente uma prática muito comum pelo Brasil. O asfalto danificado e envelhecido não é removido. Simplesmente colocam uma nova camada asfáltica por cima, esquecendo o que permanece por baixo.
Esta prática
gera reflexão de trincas para a nova camada asfáltica. Uma camada asfáltica
nova sobre outra camada existe com muitos defeitos, sem realizar a remoção através
da fresagem. Quando ocorre uma situação como esta, o pavimento já está
condenado a sofrer trincas por reflexão.
Uma camada asfáltica totalmente trincada recebe uma
nova camada de pavimentação acima. Fotos: Felipe Cava, blog Além da Inércia: https://alemdainercia.wordpress.com/
5. FALTA DE NIVELAMENTO NA
PAVIMENTAÇÃO:
Trafegar nas cidades brasileiras significa sacolejar o tempo todo. Não apenas por causa dos buracos, mas também por causa da falta de nivelamento na pavimentação tanto no sentido longitudinal quanto no transversal. Praticamente não há o uso dos sistemas de nivelamento eletrônico nas pavimentadoras (vibroacabadoras) de asfalto que executam a pavimentação. A mistura asfáltica é aplicada por cima de uma base nivelada apenas pela passagem da lâmina de uma motoniveladora, o que não garante a regularidade geométrica.
Como melhorar? Há sistemas mais simples de nivelamento eletrônico. A instalação de sensores ultrassônicos faz com que a média das irregularidades seja repassada para a mesa compactadora da máquina, amenizando os desníveis longitudinais.
Raramente utilizam os
sistemas de nivelamento automático nos equipamentos. O que poderia diminuir as
irregularidades longitudinais e transversais dos pavimentos asfálticos.
O uso de simples sensores
ultrassônicos, sem contato, pode melhorar a qualidade da pavimentação de ruas e
avenidas.
6. USO INDISCRIMINADO DO
ASFALTO À FRIO ENSACADO
Eis uma prática que se dissemina feito erva-daninha pelo Brasil. O uso desenfreado do asfalto ensacado, como se fosse uma solução mágica para resolver todos os problemas das vias públicas brasileiras.
O asfalto a
frio ensacado é uma mistura asfáltica que utiliza um aditivo especial, que aumenta
sua capacidade lubrificante e permite que o material seja ensacado logo após
ser produzido. Posteriormente, ao abrir o saco, inicia-se o processo de reação
do aditivo com o oxigênio, diminuindo a trabalhabilidade da massa asfáltica e
provocando o endurecimento do material.
O produto não
é ruim, desde que seja utilizado de forma adequada. Para prefeituras que não
tenham maquinário próprio, ou regiões do Brasil que são carentes de empresas
especializadas em pavimentação, o asfalto ensacado pode ser uma ótima opção
para ser utilizado em caráter emergencial para operações tapa-buraco.
Acontece que alguns
fornecedores do produto vendem “gato por lebre”. Afirmam que o material pode
ser aplicado em buraco cheio d´água e que pode ser compactado pelo próprio
tráfego. Uma bobagem total. Nenhum buraco com água dentro é devidamente tapado sem
estar seco, é uma lei básica da física (dois corpos não podem ocupar o mesmo
lugar no espaço ao mesmo tempo). Se a água não é removida, então como o novo
material vai preencher o volume e não se soltar dentro de pouco tempo?
Outra inconsistência técnica divulgada por alguns fornecedores é que o asfalto ensacado pode ser compactado pelo próprio tráfego. Isto significa que o serviço é precário, sem estar nivelado com o pavimento existente. Resumindo: dinheiro público sendo rasgado através de um serviço muito mal feito.
Outra inconsistência técnica divulgada por alguns fornecedores é que o asfalto ensacado pode ser compactado pelo próprio tráfego. Isto significa que o serviço é precário, sem estar nivelado com o pavimento existente. Resumindo: dinheiro público sendo rasgado através de um serviço muito mal feito.
Aplicação precária e péssima
qualidade final são características comuns no uso de asfalto ensacado para
tapar buracos.
7. CULTURA DO REMENDO “AD
ETERNUM”
A mistura asfáltica tem uma vida útil. Depois que perde sua capacidade flexível, após sofrer um gradual processo de oxidação, passa a sofrer com o surgimento de trincas e fissuras. É preciso então remover totalmente a camada envelhecida e aplicar um novo material. Mas o que fazem as prefeituras? Vão aplicando remendo ao lado de remendo.
Em algum momento o pavimento asfáltico vai entrar em colapso. Em alguns casos o prazo de validade já está tão vencido que basta uns dias de chuva para o pavimento literalmente “se dissolver”. É o famoso asfalto “Sonrisal”. Infelizmente uma realidade muito comum das cidades brasileiras.
A precariedade do asfalto
brasileiro gera piadas e memes na internet.
8. TAPA-BURACO EXECUTADO DE
FORMA ERRADA
A operação tapa-buraco é necessária para consertar a via de forma emergencial. Mesmo em países onde jorra petróleo do solo e dinheiro não é problema, não há como substituir totalmente a camada asfáltica quando surge um único buraco. Ou seja, as operações emergenciais para tapar buracos são realizadas mesmo em países onde a pavimentação é impecável. Só que esta operação deve seguir alguns procedimentos técnicos.
Uma das falhas
mais comuns no tapa-buraco é jogar o material sobre um buraco sem recortar o
mesmo. Ao redor de um buraco existente há inúmeras trincas por onde a água
entra e assim inicia o processo de degradação do pavimento. Ou seja, um novo
buraco pode surgir ao lado do buraco que recém foi tapado.
Outras ocorrências de má-qualidade na execução do tapa-buraco é a falta de pintura de ligação para garantir a aderência da nova mistura asfáltica, o uso de material asfáltico inadequado, a falta de nivelamento com o pavimento existente, falhas ou até mesmo ausência de compactação do novo material, entre outros erros.
Outras ocorrências de má-qualidade na execução do tapa-buraco é a falta de pintura de ligação para garantir a aderência da nova mistura asfáltica, o uso de material asfáltico inadequado, a falta de nivelamento com o pavimento existente, falhas ou até mesmo ausência de compactação do novo material, entre outros erros.
Os buracos devem ser
recortados, preferencialmente através de fresagem. O novo material deve ser
colocado de forma homogênea, compactado e nivelado.
9. DESNIVELAMENTO DE BUEIROS E
TAMPAS DE INSPEÇÃO
Eis aqui um dos maiores problemas da pavimentação urbana brasileira. As prefeituras são totalmente omissas em relação aos desníveis de bueiros e tampas de inspeção nas ruas e avenidas das cidades. Desníveis que podem até mesmo ocasionar acidentes graves.
Em muitas
cidades o asfalto deteriorado sequer é removido, colocando uma nova camada
sobre a capa existente. Porém o bueiro segue na altura anterior, resultando em
um grande e perigoso desnível. Esta diferença na altura da tampa deveria ser
ajustada para o nível do novo pavimento.
Tampas de inspeção e bueiros
desnivelados é um problema muito comum em praticamente todas as cidades do
Brasil.
Vejam como que
se faz a adequação da altura de tampa de inspeção na Alemanha:
10. INTERFERÊNCIAS DAS
COMPANHIAS DE ÁGUA, ESGOTO, GÁS, ETC.
É muito comum pelo Brasil os órgãos municipais de água e esgoto realizarem a escavação em um pavimento relativamente novo para realizar algum conserto ou instalação de tubulação. O problema é que na grande maioria dos casos o acabamento do local que foi trabalhado fica péssimo, com remendos muito mal feitos.
Em geral são
utilizados materiais de baixa qualidade, com misturas asfálticas diferentes do
restante da camada asfáltica da via. Os procedimentos técnicos de aplicação e
compactação são inadequados, muitas vezes realizados de forma precária,
manualmente. Não é incomum permanecer um desnível com o pavimento existente.
Para os
departamentos de água, esgoto, gás, etc, é preciso também fornecer o devido
treinamento, caso estes órgãos venham a executar consertos que exijam a
escavação do pavimento asfáltico e o seu fechamento posterior.
A falta de planejamento e a intervenção de outros
órgãos municipais em uma via pavimentada geram problemas de qualidade no
pavimento
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