terça-feira, 26 de agosto de 2025

10 razões para uso do microrrevestimento

 


O Brasil tem pouco mais de 12% de sua malha viária pavimentada, o que representa aproximadamente 213.000 quilômetros, sendo que mais da metade destas rodovias estão em estado regular, ruim ou péssimo (fonte: pesquisa CNT – Confederação Nacional dos Transportes, 2024). Nesta mesma pesquisa ainda são apresentados dados a respeito da baixa densidade da malha pavimentada do país (25,1 km/mil km²) enquanto países como China e Estados Unidos apresentam números muito superiores (447 e 437,8 km/mil km² respectivamente). Nossos vizinhos da América do Sul também estão a nossa frente tais como Uruguai (43,9), Argentina (42,3) e até mesmo o Equador (31,4). Estamos a frente apenas do Paraguai (21,1) e da montanhosa Bolívia (8,9). Ou seja, a carência de infraestrutura no Brasil ainda é gigantesca para um país de dimensões continentais e atualmente a oitava economia do mundo.

Os dados mostram que ainda há muito a ser feito na infraestrutura do país, especialmente para diminuir o grande percentual de rodovias não-pavimentadas e aumentar a densidade da malha pavimentada. Ou seja, é preciso adotar técnicas de preservação de pavimentos para que não haja um aumento na degradação que venha a gerar maiores danos e assim maiores custos para reparos e manutenção corretiva, atrapalhando também a expansão da malha pavimentada. Hoje grande parte dos problemas existentes nas rodovias brasileiras são ocasionadas pela falta de manutenção adequada e aumento substancial das cargas aplicadas pelo tráfego pesado, cuja solução para resolver este problema estrutural de forma rápida e econômica pode ser a reciclagem profunda com emulsão asfáltica.

A nível mundial a técnica mais utilizada para manutenção preventiva e preservação de pavimentos é o microrrevestimento asfáltico à frio, conhecido também pela sigla MRAF. Pela forma rápida e fácil de aplicação, utilizando uma usina móvel acoplada a um caminhão, promovendo a mistura de agregados, emulsão asfáltica modificada por polímero e aditivos, dosando e aplicando em tempo real. No Brasil é bastante utilizado especialmente pelas concessionárias de rodovias, porém a nível de obras públicas o percentual utilizado ainda é muito menor quando comparado com as rodovias privadas. Abaixo, um vídeo da empresa Asfaltopav mostrando como é executado o MRAF:


Podemos selecionar 10 razões técnicas para que o microrrevestimento asfáltico à frio seja mais utilizado e difundido no Brasil:


1.      AUMENTO DA VIDA ÚTIL DO PAVIMENTO

O pavimento asfáltico pode ter sua vida útil prolongada entre 4 e 8 anos, dependendo de outras variáveis tais como condições das camadas de base, volume de tráfego (se não ocorrer um aumento significativo de acordo com o projeto inicial de dimensionamento), ou surgimento de trincas de maior tamanho, etc. Para pequenas fissuras a técnica serve para preencher os espaços, retardando a propagação das mesmas. Embora não tenha função estrutural, o MRAF suporta muito bem os esforços aplicados pelo tráfego pesado nas principais rodovias do Brasil, protegendo a estrutura do pavimento.

MRAF aplicado em duas faixas, do lado esquerdo com a emulsão já rompida e do lado direio com a emulsão ainda em processo de rompimento.


2.      MELHORIAS TÉCNICAS NAS CONDIÇÕES FUNCIONAIS

Pequenas irregularidades ou pavimentos em condições de desgaste superficial com baixo atrito (asfalto muito liso) ou excesso de ruído (alta rugosidade) podem ser tratados com a aplicação de uma simples camada de MRAF. Alguns pavimentos com problemas podem ter uma restauração de suas características funcionais, melhorando o conforto e segurança do rolamento.

O MRAF apresenta melhores condições de rolamento e de ruído em relação aos tratamentos superficiais do tipo TSS (Tratamento Superficial Simples) e TSD (Tratamento Superficial Duplo), até pela forma de aplicação que garante uma mistura homogênea enquanto os tratamentos são dependentes do espargimento, sendo assim mais suscetível a ocorrer algum desajuste no processo tais como entupimento de bicos, além de não cobrir totalmente os agregados pois os mesmos são espalhados sobre o pavimento antes da aplicação da emulsão asfáltica. Sobre a forma de aplicação de ambas as técnicas, os detalhes já foram postados aqui no Blog em um artigo de 2018.   

Execução do MRAF ocorre de forma rápida e precisa.


3.      REDUÇÃO DE CUSTOS DE MANUTENÇÃO

As camadas de CBUQ (concreto betuminoso usinado à quente) sofrem um lento processo de oxidação e envelhecimento, sendo necessário que um dia essa camada seja removida através da fresagem asfáltica e a colocação de uma nova camada após o fim da vida útil da camada de rolamento. Ou seja, uma nova mistura de CBUQ precisará ser usinada, transportada, aplicada e compactada.

O uso do MRAF é muito mais barato do que o processo de fresagem e reconstrução, portanto ao longo dos ciclos de manutenções pode representar reduções de custo bastante significativos. As fotos abaixo mostram dois momentos: após a aplicação de uma faixa do microrrevestimento asfáltico e a segunda foto a condição do pavimento após a finalização da obra, apresentando uma rodovia com o pavimento revitalizado.

Aplicação de uma camada de MRAF com a emulsão ainda na coloração marrom antes do rompimento, quando ocorre a separação da fase asfáltica da fase aquosa após evaporação ou absorção da água pelos agregados.


MRAF após o rompimento (faixa do lado direito) com uma coloração mais escura.


Pavimento em excelente condição após a aplicação de MRAF e sinalização.


4.      DIMINUIÇÃO NO USO DE MATÉRIA-PRIMA

Na mesma comparação com a técnica de remoção da camada asfáltica degradada através da fresagem e da usinagem a aplicação de uma nova camada, ocorre uma grande diminuição no uso de matéria-prima virgem que consiste em agregados minerais e cimento asfáltico de petróleo (CAP). A economia é de pelo menos 30%, dependendo da profundidade de fresagem e espessura da nova camada a ser construída o número pode ser ainda maior. Em regiões com carência de fornecimento de insumos pode ser bastante significativo essa diferença.

MRAF cerca de 2 horas após a aplicação.


5.      EXECUÇÃO ÁGIL E RÁPIDO RETORNO DO TRÁFEGO

A aplicação do MRAF é feita de forma rápida utilizando um equipamento conhecido como Usina de Micropavimento, acoplado a um caminhão que se locomove ao mesmo tempo que o equipamento executa a dosagem e mistura dos agregados com a emulsão asfáltica do tipo RC (ruptura controlada) com aplicação simultânea sobre o pavimento através de uma mesa acabadora.

O retorno do tráfego pode ocorrer em até 2 horas, podendo chegar a apenas 1 hora de liberação com o uso de aditivos especiais que podem ser adicionados na emulsão asfáltica.

Aplicação do MRAF com a utilização de usina móvel apropriada.


6.      IMPERMEABILIZAÇÃO DO PAVIMENTO.

A aplicação do MRAF permite a impermeabilização da estrutura do pavimento, prevenindo a ação da água que pode causar um grande dano ao penetrar por trincas e fissuras existentes. Junto da ação da carga aplicada pelo tráfego pesado ocorre uma combinação resultando em um efeito erosivo da parte inferior para a parte superior do pavimento, com bombeamento de finos e perda gradativa da capacidade estrutural, levando a estrutura gradativamente até uma situação de colapso.

Condição do MRAF logo após a sua aplicação.


7.      APLICAÇÃO EM TEMPERATURA AMBIENTE.

O uso da emulsão asfáltica é a maneira de aplicar em temperatura ambiente um produto asfáltico para produzir uma mistura consistente. A química presente se dá através de agentes emulsificantes (surfactantes ou tensoativos) que permite a dispersão do asfalto na água e a posterior ruptura da emulsão, quando o asfalto se separa da fase líquida e adere ao agregado mineral ou à superfície onde foi aplicada. Em termos simples, é quando a emulsão “seca” e o asfalto volta a agir como um ligante sólido, passando de uma coloração marrom para uma cor mais escura. Este processo é essencial para que a mistura ganhe resistência mecânica e durabilidade.

O uso da emulsão asfáltica no MRAF permite que a aplicação ocorra em temperatura ambiente, sem aquecimento do produto asfáltico, reduzindo as emissões de CO2 de forma significativa. Além do menor impacto ambiental, a técnica garante mais segurança e salubridade para os trabalhadores e boa trabalhabilidade em climas úmidos.

MRAF aplicado em temperatura ambiente, sem necessidade de aquecimento do ligante asfáltico. 


8.      FACILITA FUTURAS INTERVENÇÕES DE MANUTENÇÃO.

O emprego do MRAF permite que as intervenções técnicas sejam otimizadas de modo a aumentar a vida útil do pavimento de forma econômica e de rápida execução. Em combinação com a técnica da microfresagem asfáltica, a camada delgada do MRAF pode ser facilmente removida, sem necessidade de remover a camada de CBUQ abaixo caso a mesma se encontre em boas condições. Se a camada de MRAF não apresentar desgastes significativos, uma segunda camada pode ser aplicada acima sem necessidade de remoção.

A microfresagem asfáltica é uma técnica que utiliza tambores de corte nas fresadoras com maior número de ferramentas de corte (bits) e uma profundidade bastante rasa, geralmente de apenas 10 mm. Assim é possível realizar a substituição de camadas delgadas de forma rápida e ágil.  Nas fotos abaixo (fonte: João Francisco Canevari Júnior, empresa Asfaltopav) podemos observar como fica o pavimento após a intervenção de microfresagem.

A microfresagem de camada asfáltica é uma leve raspagem do pavimento com o uso de um tambor de corte com maior número de ferramentas e menor espaçamento entre as linhas de corte.


Aplicação de MRAF logo após a microfresagem do pavimento existente.


9.      APRIMORAMENTO DO SISTEMA DE GERENCIAMENTO DE PAVIMENTOS

A técnica permite uma adequação do Sistema de Gerenciamento de Pavimentos (SGP) à realidade de campo com macro análise focada no ciclo de vida de longo prazo. Conforme já mencionado, o MRAF pode ser aplicado de forma sucessiva caso não apresente desgastes significativos. Caso apresente desgastes ou algum tipo de defeito, pode ser removido através da microfresagem. Se a camada asfáltica abaixo não apresentar algum tipo de problema, as manutenções ocorrem apenas na parte superficial. Se a estrutura se mantiver intacta, as manutenções se concentram apenas nas camadas asfálticas.

Sem o uso do MRAF, a alternativa para manutenção de pavimento asfáltico se limitaria na sua remoção através da fresagem asfáltica assim que a camada asfáltica alcançar o fim de sua vida útil. A presença do MRAF agrega uma proteção para a camada asfáltica de modo a retardar o seu envelhecimento natural, que ocorre também em função da exposição à radiação solar e as variações de temperatura.

Imagem aérea da execução do MRAF divulgado pela empresa Garcia Monteiro. 


10.      REAPROVEITAMENTO DO RAP

Um tema muito debatido no campo técnico e acadêmico da pavimentação é o reaproveitamento do material asfáltico reciclado, o RAP (Reclaimed Asphalt Pavement), popularmente chamado no Brasil de material fresado. Se discute muito o reaproveitamento de RAP em usinas de asfalto assim como em misturas asfálticas à frio tais como PMF, etc. Assim como nestas outras técnicas de pavimentação, o uso do RAP pode ser também perfeitamente empregado na aplicação de MRAF. Já tivemos no Brasil diversas experiências, reduzindo o uso de agregados virgens e assim dando destinação a volumes de RAP que estavam sem o devido reuso.

Os imensos depósitos de RAP que se acumulam em todo o Brasil podem ter parte de seu estoque direcionado também para o uso em MRAF, com o devido peneiramento, destorroamento e separação granulométrica específica.

O uso do RAP no MRAF já é uma realidade em diversos projetos, tais como este divulgado pela empresa Garcia Monteiro, onde foi utilizado 70% de RAP.


Ainda há espaço para melhorias técnicas no uso do microrrevestimento asfáltico no Brasil. A técnica encontra algumas objeções em função de projetos mal elaborados ou mal executados. No entanto mesmo obras bem executadas podem ser aprimoradas tecnicamente através dos seguintes pontos:

·        Aplicação em trechos contínuos representam uma grande redução no custo por metro quadrado em relação a aplicações em trechos segmentados e descontínuos, o que ainda é muito realizado no Brasil mesmo por concessionárias privadas de rodovias;

·        Curva granulométrica pode ser aprimorada com o afinamento da curva, melhorando a macrotextura superficial e reduzindo o ruído gerado pela passagem do tráfego;

·        A utilização de agregados de boa qualidade, com menos presença de argilas e outros tipos de contaminações;

·        Uso de emulsão asfáltica customizada em condições especiais tais como aplicações noturnas, clima mais frio, agregados mais reativos e planos de aplicação com menores janelas de trabalho;

·        Aprimorar o controle de ruptura usando aditivos específicos, não dependendo totalmente do clima e do uso excessivo de água, como ocorre em boa parte das obras pelo Brasil.

 

Para quem deseja se aprofundar mais sobre o MRAF, o vídeo abaixo publicado pelo IPOS Especialização apresenta valiosas informações com a participação da empresa Garcia Monteiro, uma das mais especializadas no Brasil nesta aplicação:


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